Por Rita Alambre dos Santos, especialista em Educação Especial e Reabilitação e directora-geral da Fundação Renascer. Estágio de observação no “Social Thinking
A maior parte da aprendizagem social é feita por observação. Quer isto dizer que as crianças têm o talento natural para reparar na forma como os outros à sua volta estão a fazer e adaptar o seu próprio comportamento àquilo que é esperado em determinado contexto.
O Pensamento Social ou Inteligência Social consiste na capacidade que temos para reconhecer e compreender os pensamentos, emoções, desejos e intenções das outras pessoas, encontrando-lhes sentido e sendo capaz de predizer o que farão a seguir. De uma forma mais simples, podemos dizer que é a capacidade de nos colocarmos no lugar do outro. Desta competência depende a nossa capacidade de adaptação aos diferentes contextos e o sucesso ou não das nossas relações interpessoais, sejam elas íntimas ou casuais, familiares ou de trabalho... Permite-nos compreender a situação global e “intuir” a atitude a tomar perante determinado cenário. As competências sociais são os instrumentos que temos à nossa disposição para cumprir o objectivo final, ou seja, que comportamento tomar de maneira a que os outros pensem de mim aquilo que eu quero que pensem. A capacidade para o desenvolvimento do pensamento social é inata, na maior parte de nós, sendo a sua aprendizagem feita por observação e imitação, ao longo de toda a vida. Na realidade trata-se de uma aprendizagem intuitiva, da qual temos pouca consciência. Por outro lado está também dependente da observação e compreensão de uma série de componentes da linguagem não-verbal, como as expressões faciais, o tónus corporal, a proximidade/distância a que nos colocamos dos outros, o tom de voz, etc., mais do que das palavras que são ditas. De acordo com isso, desde o nascimento o bebé encontra-se num diálogo permanente com os seus pais, sendo capaz de alterar os seus comportamentos de forma a suprir as suas necessidades imediatas, bem como de ler os comportamentos destes, atribuindo-lhes significado.
O “treino das regras” Se estivermos perante uma criança que não apresenta um défice na cognição social, a família, a escola, bem como outras actividades em que a criança esteja envolvida, incumbir-se-ão de fazer o seu papel de forma natural, ou seja, recompensá-la pelos comportamentos adequados e punir aqueles que não o são. Pais e professores podem estimular estas competências, ajudando a criança, a partir dos quatro anos de idade, a compreender as consequências das suas acções nos pensamentos e sentimentos das outras pessoas em relação a ela e a reconhecer que tem poder para modificar a percepção dos outros a seu respeito. Nas crianças mais novas, costuma ser útil a concretização destes conceitos em ferramentas mais fáceis de utilizar. Michelle Garcia Winner (terapeuta da fala americana, especialista nesta temática e em crianças com défice de atenção) fala-nos de “pensamentos azuis versus pensamentos encarnados”, de “ficheiros de amizade” ou do “detective social” que há em cada um de nós. O que é que isto significa numa situação concreta? Quando estamos perante uma situação nova, em que não sabemos comportarmo-nos como é suposto, usamos os nossos olhos para pensar nos outros e para encontrar pistas no contexto que nos cerca. Agimos como um detective à procura de pistas para resolver um problema. O objectivo é que os nossos comportamentos despertem nos outros “pensamentos azuis”, ou seja, pensamentos agradáveis que fazem com que gostem de nos ter por perto. Todos esses pensamentos irão ser guardados no “ficheiro” que têm na sua cabeça com o meu nome escrito. Da próxima vez que me virem, esse ficheiro abrir-se-á automaticamente e a reacção das outras pessoas à minha presença será tão mais positiva quanto maior o número de pensamentos azuis que tiverem armazenado a meu respeito. Esta concretização de conceitos é o contrário do que geralmente fazemos com as crianças pequenas e ajuda-as a organizar o pensamento e serem capazes de cumprir aquilo que lhes é pedido. Na maior parte das vezes limitamo-nos a utilizar uma linguagem abstracta como, por exemplo, “porta-te bem”. Ora, esta frase por si só é completamente vazia de significado se não explicarmos à criança o que, concretamente, consideramos ser “portar bem”. É preciso ser preciso e objectivo naquilo que se quer, caso contrário é muito provável que adultos e crianças acabem frustrados no processo de gestão dos comportamentos. Uma vez apreendidas essas regras, como mantê-las e desenvolvê-las? Existe um mecanismo básico por detrás do pensamento social que uma vez apreendido fará com que a pessoa seja capaz de resolver situações diferentes utilizando a generalização do que aprendeu. No entanto, esta generalização não ocorre nas pessoas em que existe um défice da cognição social, sendo desejável que possa contar com o apoio de um técnico para a ajudar a decifrar os códigos sociais a que ainda não teve acesso. Com as diferentes fases da vida, surgem novos desafios, sendo que as dificuldades para encontrar uma solução eficaz e de forma autónoma persistem, podendo dar origem a comportamentos bizarros. Por exemplo, durante a infantil ou mesmo na escola primária, é visto como natural saltar para o colo da mãe quando ela vai buscar o filho à escola e enchê-lo de beijos. No entanto, o mesmo comportamento na entrada para o 2º ciclo será visto como desadequado pelos colegas. O mesmo se pode passar em relação à proximidade física com a professora. A chegada da adolescência e do interesse pelo sexo oposto pode também levantar problemas, na medida em que os pensamentos mais íntimos em relação ao outro, podem ser considerados grosseiros ou mesmo ofensivos quando verbalizados sem qualquer censura. |