Sábado, 28.01.12

Há escolas...

 
Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas.
Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do vôo.
Pássaros engaiolados são pássaros sob controle.
Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser.
Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros.
...Porque a essência dos pássaros é o voo.
Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados.
O que elas amam são pássaros em voo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o voo, isso elas não podem fazer, porque o voo já nasce dentro dos pássaros.
O voo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado.

Rubem Alves
 
 
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Terça-feira, 03.01.12

A Revolução das Crianças

A Revolução das Crianças

São urgentes os espaços ruidosos e o silêncio nas famílias. E que os pais reclamem para si o que exigem às crianças. Como o mimo. É urgente que nos reconciliem com as palavras infantis como: «ajuda-me», «tenho medo», ou «quero mais».


Depois das grandes revoluções que o império romano e o cristianismo trouxeram à Humanidade, mudando mentalidades e comportamentos, os portugueses terão criado a grande revolução do renascimento (que veio a encaminhar-nos para a revolução francesa e para o positivismo). Na verdade, os descobrimentos portugueses e o terramoto de Lisboa mudaram o mundo. Os primeiros, porque revelaram quanto o engenho humano consegue ultrapassar medos e demónios. O segundo porque deixou a descoberto a grande incongruência da justiça divina (dando espaço para que a justiça dos homens se substituísse à delegação papal na constituição do poder político e
Confluísse para a ideia de um Estado de Direito).

A exponencial bondade da técnica, no nosso quotidiano, a significativa democratização dos recursos económicos e do acesso ao conhecimento, no pós-guerra, e o contacto cada vez mais tardio com a morte e com a nossa pequenez tornaram a religiosidade distante e assustadora. E o ato de religar e de sintetizar o que se sabe com o que se desconhece foram tornando, no nosso tempo, a subjetividade humana distante, misteriosa e assustadora. Curiosamente, estamos a chegar a um tempo onde a lei do Homem passa por um exorbitante deslumbramento fugindo de todas as realidades que impliquem exaltação, dúvida, paixão, medo, fantasia ou sonho, enfim.

A hegemonia técnica na construção do pensamento parece encaminhar-nos para a ideia de que, desde que funcione, tudo pareça valer, levando a supor que o essencial do conhecimento passa por rentabilizar o que se conhece e não tanto a tomá-lo como
o pequeno piscar com que reconhecemos as pessoas com quem contamos para não soçobrarmos ao escuro.

Num mundo dominado pela técnica e pelas flutuações da economia, como podemos compreender a função das crianças na vida dos pais? Acredito que se desenha uma nova revolução. Movida pela subjetividade humana e pelos valores da relação.
E, nesse contexto, as crianças e a família serão, no futuro, ainda mais preponderantes. Não no sentido dos pais deprimidos – que tantos slogans não se cansam de acarinhar, atormentados por não darem tempo, em quantidade, aos seus fi lhos – que (em vez
de brincarem com eles) os empanturram de brinquedos, que se submetem todos os fins-de-semana ao programa social das crianças e que – de cada vez que devem dizer «não» – se sentem no dever de o sufragar, através de muitas alíneas, pelo «douto» assentimento dos mais pequenos.

Acredito que a revolução das crianças passa por nos percebermos, por dentro, à escala do universo, pequeninos, como elas. Aumentando o perímetro da nossa ignorância à medida que conhecemos. Percebendo que crescer significa separar e enxergando - como elas fazem quando brincam – que, de cada vez que nos confiamos, estamos em Deus (en-theos, de onde surge a palavra entusiasmo). Logo que nos comungamos, transformamos saber em sabedoria. E sempre que escutamos somos mais clarividentes, mais justos, mais bonitos e melhores. É comovente como, para elas, somos a sua fonte de vida, de sabedoria, de justiça e de futuro. E somos – numa só relação – a janela para todas as revoluções com que a humanidade pula e avança. É por isso que eu acredito que a revolução das crianças passa por fazermos com elas como elas fazem connosco. Sendo assim:

É urgente que não protejamos as crianças de todos os riscos. Apesar disso, é fundamental que sejam protegidas do maior de todos: a infância dolorosa dos seus pais. É urgente que os pais se reencontrem com a sua infância na dos filhos, porque as dificuldades na educação não passam pelo modo como eles não escutam as crianças mas pelo ruído, ensurdecedor, dos seus sofrimentos infantis nos seus gestos de pais.
São urgentes os espaços ruidosos e o silêncio nas famílias. E que os pais reclamem para si o que exigem às crianças. Como o mimo.

É urgente que nos reconciliemos com palavras infantis como: «ajuda-me», «tenho medo», ou «quero mais». E com práticas milenares como «a vista na ponta dos dedos» e «o espreguiçar» (do coração).

Só assim criaremos uma nova revolução. Das crianças! Movida pela subjetividade humana e pelos valores da relação. Para que, sempre que as escutamos, nos tornemos mais clarividentes, mais justos, mais bonitos e melhores. Fonte de vida, de sabedoria e de futuro.

 

http://www.paisefilhos.pt/index.php/opiniao/eduardo-sa/3886-a-revolucao-das-criancas

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Terça-feira, 27.12.11

Educação para Totós - Eduardo Sá


Educação para Totós - Eduardo Sá

"Muitos pais enfeitiçam as crianças, tornando-as sapos, quando as transformam no seu precioso espelho mágico, ficando totós uns para os outros.

1. Nas histórias para as crianças há, regra geral, uma princesa adormecida (de preferência formosa) e um cavaleiro apaixonado que se propõe despertá-la, com um fogoso beijo nos lábios. É verdade que poucos pais consideram que esta tendência obstinada de um transeunte, cheio de amor-próprio, para incomodar (com beijoquices) o eterno descanso da princesa seja um mau exemplo para as crianças. E é verdade, também, que se fosse um filho nosso a beijar (mesmo por distracção) um sapo com quem se tivesse cruzado, em vez de despontar – de tão fortuita fortuna - um príncipe teríamos lá em casa uma zaragata à italiana. Por outras palavras: não há quem entenda a forma imprudente como os adultos põem aos beijos as personagens das histórias para as crianças…
Mas – pior ainda – o que me preocupa é que nessas histórias há sempre uma pessoa que dorme e outra que a desperta. E isto já é publicidade enganosa. Porque – todos sabemos – duas pessoas acordam sempre que aquilo que as liga as desperta, uma à outra, ao mesmo tempo. Aliás, eu acho que, com as crianças, se passa, sensivelmente, ao contrário do que sucede às princesas e aos sapos: elas estão despertíssimas mas, mais beijo menos beijo, há sempre alguém que não descansa enquanto não as adormece, por dentro, e as transforma em totós. (Se pensava que o lado enganador das histórias para as crianças passava pela forma como elas falam, por exemplo, de fadas – como se fosse possível encontrá-las numa qualquer repartição – ou pelo engenho com que põem uns pares de renas e o Pai Natal às voltas pelo ar, está muito enganado…).
2. Histórias à parte, são muitas as circunstâncias em que os pais acumulam muitos créditos com os quais tornam as suas crianças um bocadinho adormecidas. Ou, se preferirem, um tudo-nada… totós. Daí que, para acabarmos, de vez, com esta tentação de transformarmos crianças despertas em totós adormecidos devemos dizer que:
- as crianças estão autorizadas a sujar-se. As crianças que não se sujam não são uns anjos: ainda não descobriram que serão pessoas melhores sempre que forem pequenos índios com coração e com maneiras;
- as crianças devem brincar, também, na rua. Sempre que só sentem a cidade através dos vidros do carro dos pais deixam de ser crianças: ficam macambúzias;
- as crianças precisam de descobrir o tempo livre. Quando têm uma agenda e nunca mandam nos seus minutos – pelo menos quando brincam – não são crianças. São burocratas de mochila;
- as crianças têm o «direito constitucional» de andarem de cabeça no ar. Sempre que alguém as quiser certinhas e crescidas ficam rezingonas. E só quando forem pais, com um sentimento que viveram adormecidos, é que irão perceber que só aprende quem põe ao leme, para sempre, a vontade de rir;
- as crianças têm o dever de crescer com a ajuda de algumas trapalhices, porque só as crianças trapalhonas sabem que o brincar é a melhor escola de todos os imprevistos;
- as crianças estão autorizadas a cair. Nunca caindo não aprendem a cair;
- as crianças devem lutar, várias vezes por semana. Primeiro, com almofadas, com os irmãos. Depois, no chão da sala, com o pai. E, a seguir, com os amigos, fora de casa. Se nunca lutam podem, até, parecer exemplares. Mas não são crianças: tornam-se «xoninhas»;
- as crianças têm o direito a não ser falsamente elogiadas. Sempre que as elogiam, como se fossem tolas, viram sapos. Podem até ser belas. Mas tornam-se adormecidas.
3. Nas histórias para as crianças há, regra geral, uma princesa adormecida (de preferência formosa) e um cavaleiro apaixonado que se propõe despertá-la, com um fogoso beijo nos lábios. Mas, na verdade, quem estraga as histórias das princesas adormecidas não são nem os dragões nem as maçãs envenenadas. Nem o riso sarcástico das bruxas. Nem, muito menos, o lobo mau, o capitão Gancho ou a Maga Patalógica São mais os espelhos mágicos. E, pior, muitos pais enfeitiçam as crianças, tornando-as sapos, quando as transformam no seu precioso espelho mágico, ficando totós uns para os outros. E, mais beijo menos beijo, esquecem que, ao contrário das histórias, as pessoas só acordam sempre que despertam, umas para as outras, ao mesmo tempo."
Escrito por Eduardo Sá
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Terça-feira, 20.12.11

A nossa pátria são todas as crianças.

Por Eduardo Sá

 

Todas as crianças têm o direito a ser crianças. E têm o direito a crescer livres, mas com regras, num país amigo das crianças.

Todas as crianças têm o direito a um país cuja Lei do Trabalho preveja que as consultas de obstetrícia sejam, também, uma obrigação de todos os homens à espera dum bebé. Onde as crianças não tenham de sair cedo demais de casa. E onde os berçários e os jardins-de-infância sejam, tendencialmente, gratuitos e para todos, sendo reconhecidos como uma condição essencial para que a educação seja melhor, mais plural e mais bonita.

Todas as crianças têm direito a uma escola que as eduque, antes de instruir. Onde não passem tempo demais, todos os dias. Em que as aulas não sejam tão grandes como têm sido e se poupe nos trabalhos de casa. E em que os recreios sejam maiores em tempo e melhores nas condições de segurança e nos recursos que põem ao dispor de todas as crianças.

Todas as crianças têm, também, direito a livros escolares gratuitos, para todo o ensino obrigatório, que sejam, idealmente, propriedade de cada escola, sendo as crianças obrigadas a acarinhá-los, todos os dias, porque só quando o conhecimento passa de uns para outros, e se trata com cuidado, nos torna sábios.

Numa escola amiga das crianças os professores contam histórias e acarinham, quando ensinam. E haverá, por isso, um quadro de honra para todos os alunos faladores. Porque uma escola que não fala e não escuta vive assustada e fechada sobre si. E, se for assim, educa mal. E não é escola.

Numa escola amiga das crianças todas elas estão obrigadas a ser agressivas. Com maneiras. E a ser leais, umas com as outras. Numa escola amiga das crianças as que fazem queixinhas, a torto e a direito, os alunos exemplares, os alunos solitários e mal-educados, os alunos violentos, e aqueles que repetem mas não pensam são crianças cujos pais têm necessidades educativas especiais. Devem, portanto, ser ajudados. Mas se, teimosamente, não quiserem perceber os perigos com que magoam os filhos, talvez não merecem ser pais.

Num país amigo das crianças, todas elas têm direito a tempo livre. Sem a tutela permanente dos seus pais. E sem ateliês onde façam os trabalhos de casa, onde vejam televisão e onde tenham de estar quietas e caladas. Aliás, num país assim, todas as crianças terão direito a conversar. Porque só quando se pensa com os outros, conversando com os botões e em voz alta, ao mesmo tempo, se aprende a crescer.

Num país amigo delas, todas as crianças têm direito a brincar. Todos os dias, sem direito a férias, pontes ou feriados. E a brincar com um dos pais, 30 minutos, de segunda a domingo. Têm, também, o direito a ser filhas únicas dos seus pais, uma vez por semana, por um bocadinho. E a ter os pais, ao jantar e depois dele, sem telemóveis e sem televisão, só para a família.

Num país amigo das crianças, todos os pais que achem os filhos sobredotados, devem ficar, de vez em quando, de castigo. Porque (sem quererem, certamente) não percebem que todas as crianças (mas todas, mesmo) têm uma ou outra necessidade educativa especial. E que, pior que não a corrigir, é disfarçá-la com tudo aquilo que, supostamente, se faz bem. E não percebem, também, que as crianças que eles acham normais, só parecem mais adormecidas porque as pequenas maldades e os desamparos, a zanga sem fim e a tristeza dos pais, quase todos os dias, lhes traz (ao coração e à cabeça) um ruído de fundo que atrapalha o pensamento. Para além disso, todos os pais que - mesmo dizendo «posso estar enganado...» - acham que os seus filhos têm uma personalidade muito forte, devem ficar de castigo duas vezes, porque baralham a convicção, que vem de dentro, com a teimosia que faz «braços de ferro», por tudo e por nada com quem está fora. Mas, se por infelicidade, os pais insistirem em ser simplesmente, bonzinhos e prestadores de serviços (em vez de pais) estão poupados a todos os castigos, porque não há nada que doa mais que um principezinho que se transforma num pequeno ditador e, de imposição em imposição, chega à adolescência como grande tirano.

 

Num país com futuro, todas as crianças têm direito a uma família. E, por isso, não podem estar confiadas a centros de acolhimento tanto tempo como tantas estão. E têm o direito a uma Justiça amiga das crianças, que obrigue a segurança social a ser mais despachada e eficaz, sempre que se trate de as proteger. E se, porventura, houver quem queira transformar um Tribunal num tutor de pais zangados e desavindos, que nunca põe os interesses dos filhos em primeiro lugar, num país amigo das crianças eles serão advertidos e castigados, porque não merecem ser pais. Simplesmente, porque todas as crianças têm direito ao direito e ao afecto (que, de braço dado e como quem tagarela muitas vezes) tornam o mundo mais clarividente e mais sensato.

Todas as crianças merecem um país amigo das crianças. E, sobre tudo o resto, é-lhes devido o direito a ser crianças. Dos 0 aos 18, fazendo as contas pelos mínimos. E têm o direito a ter pais. Daqueles que, sempre que desligam o «piloto automático» com que educam e dão colo, ligam uma espécie de atrapalhador com que dizem (gritando, já se vê): «A partir de hoje!....» muitas vezes. E têm, ainda, o direito a pais de coração grande e de cabeça quente. Daqueles que fazem, pelo menos, uma asneira, todos os dias sem a qual ninguém se torna amigo das crianças. E, muito menos, mãe ou pai.

E merecem, ainda, o direito a admirar os pais e os avós. Porque só quem admira se torna humilde. E só quem conhece a sua história, e se orgulha dela, conquista o direito a ter futuro.

Todas as crianças têm, finalmente, o direito a ingonhar engonhar, a destrambulhar destrambelhar, a azucrinar e a chinfrinar. Têm direito a ter uma ou outra macacoa. E a ser, até, estrambólicas e escaganifobéticas. Que são formas complicadas de falar da salvaguarda do direito de quem se engasga e de quem se engana, de quem exagera e se atrapalha, e de quem erra. Que só é possível quando se tem pais e avós, e muitos tios ligados nelas. Que, todos juntos, façam com que, venha de onde vier, cada criança nunca se perca no caminho para casa.

Todas as crianças têm o direito a um país amigo das crianças. Onde todas as pessoas, nem que seja aos bocadinhos, sejam atentas, serenas e sábias, bondosas e firmes para com elas. Um país onde todas as crianças se sintam filhas dos pais e sobrinhas de todos. Um país que não as idolatre nem endeuse, mas que as ame, simplesmente (que é tudo aquilo que quem repete que «o melhor do mundo são as crianças», raramente, lhes dá). Porque, afinal, a nossa pátria são todas as crianças.

 

http://www.paisefilhos.pt/index.php/opiniao/eduardo-sa/4216-a-nossa-patria-sao-todas-as-criancas

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Terça-feira, 13.12.11

Eduardo Sá: “Estamos a espatifar a infância das crianças”

 

Disse um dia que as crianças estão em vias de extinção…

Estão. Não digo isso pelo facto de o Governo e a oposição as terem transformado numa espécie de conta poupança reforma. Acho até divertido que se fale de tudo e mais alguma coisa nas várias campanhas – presidenciais incluídas – e as questões das crianças e a política de fundo para a família nem sequer exista. Portanto, o que é que a mim me preocupa? Preocupa-me esta ideia complemente absurda de crescimento, que dá a entender que as crianças têm que ser jovens tecnocratas de fraldas antes dos seis, têm que ser jovens tecnocratas de mochila depois dos seis e têm que ser jovens tecnocratas de sucesso ao entrarem na universidade para que, finalmente – como se fosse uma linha de montagem –, saíssem todos mestres. Mestre é a designação mais vergonhosa que eu já vi para um título académico, porque é um título que reconhecemos aos sábios.

Andamos a enganar os jovens?

Isto é o cúmulo da publicidade enganosa. Explicar a miúdos com 22 e 23 anos que são mestres, de maneira a esperar que eles sejam, de preferência, ídolos antes dos 30… Anda toda a gente num registo eufórico e doente, que não percebe que as pessoas precisam de tempo para crescer. Acho engraçadíssimo quando dizem com orgulho que no jardim-de-infância há crianças que já sabem ler e escrever, mas não é isso que as torna mais sábias. Às vezes, as pessoas confundem macacos de imitação com crianças sábias. Acho engraçadíssimo quando as crianças não podem errar – eu julgava que errar era aprender. Mas não: as crianças têm que ter notas que são insufladas sabe Deus pelo quê. Vivem empanturradas em explicações. Se os pais puderem utilizar todo o tempo que a escola coloca ao serviço das famílias, elas podem passar 55 horas por semana na escola… Estamos a espatifar a infância das crianças, a espatifar a adolescência e, depois, com um olhar absolutamente cândido, dizemos que elas têm défi ces de atenção.

Existe a ideia que as pessoas mais escolarizadas são pessoas mais educadas?

Vive-se com essa a ideia. E peço desculpa, mas as pessoas, com toda a boa vontade do mundo, estão a tornar as crianças mais estúpidas. Se as crianças não aprendem a tolerar as frustrações, nunca hão de ser engenhosas e nunca hão de aprender com as dificuldades. A dor dói, magoa, mas é uma oportunidade de crescimento e não há dores que venham por bem. As dores são as grandes oportunidades para nos interpelarmos e para nos transformarmos. E nós não damos oportunidade às crianças para serem crianças. Queremo-las como fossem clones daquilo que nós sonhámos ser, mas que não fomos capazes. E, nestas circunstâncias, tem que haver alguém com algum bom senso que diga “tenham cuidado que estão a comprometer tudo”.

As crianças brincam pouco?

As crianças brincam de menos. Se houvesse em Portugal um Ministério da Educação digno desse nome, teria outro tipo de cuidado com os recreios das escolas. Os recreios das escolas públicas são uma vergonha. Não reúnem condições indispensáveis para brincar. As escolas deviam ter recreios cobertos, mas brincar é, para os governantes, uma atividade tipo primavera-verão: quando está frio e a chover, as crianças não podem ficar nas salas, não podem ficar nos espaços comuns, não podem andar na chuva… Brincam nos beirais, que é uma preparação para os desportos radicais. Mas, na falta de cuidados em relação às crianças, há um exemplo que é o mais delicioso do mundo: não compreendo porque é que as crianças têm uma disciplina de Educação para Saúde e depois, nomeadamente nas escolas públicas, as casas de banho dos alunos não cumprem as condições indispensáveis em termos de saúde pública. Para a ASAE, a segurança alimentar é importante, a contrafação é importante. As crianças, não.

O que lhe apraz dizer sobre toda esta polémica em torno dos contratos de associação?

Não me choca que o Estado, quando não consegue cumprir os seus compromissos, possa delegá-los noutros. E possa, na sequência disso, fazer os contratos de associação que acha que deve fazer. Até aqui, isto é pacífi co. Agora, há dois aspetos que me parecem incontornáveis: quando as pessoas querem negociar de forma séria e leal, negoceiam a tempo e horas e não me chocaria se hoje estivéssemos a negociar uma transformação para daqui a dois anos, de maneira a que se possam pensar alternativas. Não acho que o Governo tenha estado bem neste aspeto. Agora, choca-me que depois as crianças sejam instrumentalizadas de uma forma absolutamente indecorosa e sejam trazidas para discussões que não são bem razoáveis. Instrumentalizar campanhas presidenciais à esquerda e à direita com este tipo de questões, peço desculpa, é um bom serviço em favor do obscurantismo.

Cada vez mais se ouve falar de crianças maltratadas…

Felizmente.

Tal não significa que haja maior número de crianças nessa condição?

Por amor de Deus. Estas são as melhores famílias que a humanidade conheceu. As atuais. O que significa que os nossos filhos estão seguramente melhores.

O que leva um pai a maltratar um filho?

(suspira) Muito sofrimento acumulado. Pessoas doentes sempre existiram ao longo da história. O sistema judicial é que não. É uma conquista importante da humanidade e todos nós devemos exigir que um sistema judicial, dedicado às crianças, seja um bocadinho de sistema judicial e que tenha um componente significativo de saúde, nomeadamente de saúde mental. Que nós aceitemos que os pais maltratem, não podemos aceitar; que nós aceitemos que o Estado, como garante de princípios fundamentais, seja omisso na proteção das crianças, é que eu acho que seja inadmissível. Quando grande parte das comissões de proteção tem pessoas da maior generosidade que estão em part-time ou em voluntariado, isto diz bem o que é a proteção das crianças em Portugal. Quando nós admitimos que haja crianças que, no fundo, estão sinalizadas como estando em perigo, mas estão em perigo durante anos… É aqui que eu acho que temos que parar e perceber o que é que queremos da proteção das crianças. Porque o Estado não cumpre a lei. Em média, as crianças estão confiadas aos centros de acolhimento cinco anos. O Estado comete ilegalidades sobre ilegalidades a esse nível.

Mas porque é que se maltrata?

Repare: ainda hoje há pessoas que suspiram pela escola do antigo regime, que era uma escola exemplar, onde cada erro representava uma reguada. Muitos destes pais tiveram escolas e famílias muito autoritárias. É por isso que os pais hoje, quando se trata de dizer que “não” a um filho, confundem autoridade e autoritarismo. E passam a vida quase a pedir desculpa com a ideia de que o “não” traumatiza. A autoridade é um exercício de bondade; o autoritarismo é um exercício de prepotência. A prova de que nós fomos crescendo com estes equívocos é um bocadinho esta. Ainda há pais maltratantes.

De todos os estratos sociais, portanto…

De repente, até parece que os pais da classe média não maltratam. Há crianças que andam em colégios para meninos com “pedigree” e chegam lá todos os dias com marcas de serem batidas. E quando têm 80 por cento nos testes ficam em pânico, porque são aterrorizadas constantemente… Essas crianças estão em perigo. Porque é que as comissões nunca protegem esse tipo de crianças? Temos que proteger mais e proteger melhor. E os tribunais têm que ser mais duros em relação aos pais que maltratam e negligenciam porque, por mais doentes que eles estejam, não têm o direito de desbaratar todos os recursos saudáveis dos filhos.

É possível ensinar as pessoas a serem bons pais?

É. Os pais precisam de falar pelos filhos: eles sabem muito bem que quem nos ama diz-nos por atos (e por omissões) qualquer coisa como: “sente-me em ti, pensa por mim e fala por nós”. E, de facto, os pais às vezes sentem, pensam, mas não falam. Não falam nem por eles, nem pelos filhos. Ensinar pode fazer-se de maneira divertida, pode significar dizermos aos pais que estão obrigados a dar uma hora por dia aos filhos. Uma hora de mãe ou uma hora de pai, faz muito melhor do que o óleo de fígado de bacalhau para as crianças crescerem. E é necessário dizer aos pais que têm fazer, pelo menos, uma asneira de oito em oito horas. Os pais que não fazem asneiras não são bons pais.

Costuma dizer que as pessoas têm o coração apertado até ao último botão. É o que se passa com os pais?

Acho que somos todos mal-educados. Todos tivemos uma educação judaico-cristã, uma educação positivista que, em muitos aspetos foi importante, mas que criou um vício de forma muito cartesiano que nos leva a imaginar que, quanto mais racionais, melhores pessoas. Fomos todos mal-educados para as emoções. Ainda continuamos a achar que ter raiva é uma coisa feia, como se a raiva não fosse o melhor ansiolítico do mundo. Quem assume que tem ódio de vez em quando? E o ódio só acontece quando alguém que nos ama nos magoa muito. As emoções são um GPS fantástico que temos na nossa vida e nós somos educados para reprimir as emoções. Quando reprimimos as emoções, além dos efeitos neurológicos que isto provoca, vai introduzir uma coisa que é pior: à medida que não transformamos as emoções em palavras, passamos a ficar partidos ao meio. Sentimos tudo, somos tremendamente intuitivos, mas depois deixamos de aprender a falar. Quanto menos somos educados para as emoções, menos educados nos tornamos para as palavras e mais começamos a adoecer.

Somos, então, mal-educados para o amor?

Somos também mal-educados para o amor. Mas para que é que é preciso educação sexual nas escolas? Vai-me desculpar, a sexualidade faz muito bem à saúde. Mas muitas vezes esta “educação moral e religiosa parte II” está a partir do pressuposto de coisas erradas. Educar para o amor é uma coisa muito mais séria. É muito importante dizer o que é o aparelho reprodutor e falar de meios contracetivos… nada disso merece questão. Mas o que eu gostava é que também se explicasse o que é que são as relações amorosas. Devia ou não devia ser proibido casar com o primeiro namorado? Só devia. Quer dizer: passamos a vida a dizer que errar é aprender, mas nas relações amorosas temos que acertar à primeira. Onde é que isto já se viu? Isto é mentira. Se queremos educar para as relações amorosas, devíamos dizer que devia ser proibido casar para sempre.

Não devia ser para sempre?

São todas para sempre. Mas o que eu gostava que as pessoas percebessem é que quanto mais importante é uma relação mais frágil se torna. Porque exigimos às pessoas que amamos – e bem –aquilo que não exigimos a mais ninguém. E quanto mais importante for uma relação, mais preciosa ela é. Era muito bom que nós dissemos que todas as relações morrem, sobretudo as mais importantes e, sobretudo, se foram maltratadas. No fundo, educam-nos para nós abotoarmos o coração até o último botão. E, às vezes, as pessoas despem-se facilmente por fora e têm dificuldade em perceber que o grande desafio da vida é despirmo-nos por dentro. É darmo-nos a conhecer por dentro.

Teve uma infância feliz?

Gostava de ter brincado muito mais. Gostava de não ter passado por algumas situações difíceis que vivi. Poderia ser muito melhor, seguramente.

 

http://www.asbeiras.pt/2011/03/eduardo-sa-%E2%80%9Cestamos-a-espatifar-a-infancia-das-criancas%E2%80%9D/

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Terça-feira, 06.12.11

Algumas Citações de Eduardo Sá

Algumas Citações de Eduardo Sá

É psicólogo clínico, psicanalista e professor de psicologia clínica na Universidade de Coimbra e no Instituto Superior de Psicologia Aplicada, em Lisboa. Tem uma longa experiência de acompanhamento de fetos e de bebés, de crianças, de adolescentes e das suas famílias. Director da Clínica Bebés & Crescidos

 

As emoções tornam tão irrepetível tudo o que vivemos que, depois de vividos, todos os acontecimentos... «já eram». Isto é, por mais que os tentemos descrever, deixam de ser, exactamente, como os vivemos e, por isso, tornam-se... mentira

 

O silêncio só é silêncio quando não somos capazes de escutar com o coração

 

A melhor forma de não perder nada não é guardar: mas compartilhar

 

As pessoas morrem quando nos decepcionam e, para nossa perplexidade, com elas morre sempre um bocadinho, mais ou menos indecifrável, dentro de nós

 

Os mais velhos só aprendem quando aceitam que, para educar os outros, é necessário, em primeiro lugar, querer aprender com eles. E isso só é possível quando, nas intenções da educação, a aquisição de conhecimentos for substituída pelo carinho à sabedoria.

 

Amar é conhecer mais do outro do que ele sabe de si próprio, e descobrir que ele conhece mais de nós do que nós mesmos.

 

Crescemos imaginando que é possível aprender sem errar. No amor, por maioria de exigência. O que transforma, muitas vezes, o coração numa folha de cálculo. Ora, do mesmo modo que dar à luz não é tirar todas as dúvidas (mas pôr problemas), errar é aprender. E descobrir que, olhando por quem se olha, o importante nunca é saber como se faz, mas com quem se conta para chegar ao que se quer.

 

É certo que quase nada vale por aquilo que parece. E, no entanto, talvez o que pareça valha sobre o quase-nada que lhe falta para ser tudo aquilo que não é.

 

Transformar em qualquer coisa de sobrenatural tudo o que sentimos, só porque a racionalidade assim obriga, faz do silêncio uma enorme enciclopédia de todas as verdades por dizer.

 

Há muita diferença grande entre temer a morte e amar a vida. Temer a morte deixa-nos em dívida com a vida. Torna-nos minúsculos. Compenenetrados dos nossos papéis. Falsos e complicados. (...) Temer a morte deixa-nos levar pelas marés de todos os dias. Amar a vida desafia para as aproveitarmos nas rotas onde nos queremos ao leme

 

Às vezes, os políticos parecem repartir-se entre os que nunca se enganam e os que só reconhecem os erros dos outros. Os que se salvam imaginam a coerência como um lugar sem contradições. Ora, passamos bem sem os que nos indicam, uma a uma, as faltas dos outros. Perdoamos os erros, porque todos sabemos que são eles que nos ajudam a crescer.

 

Estranhos não são as pessoas que não se conhecem: estranhos são aqueles que, estando ao pé de nós, parecem nunca perceber o que se passa connosco.

http://ashera.multiply.com/journal/item/292

 

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Terça-feira, 28.12.10

Aceitar o ‘NÃO!’ Base de equilíbrio emocional

Por Filomena Santos Silva, Psicóloga

As nossas crianças pagam alta a factura da forma como nos organizamos em sociedade, em ritmos que não são os delas e com pouco tempo para relações de qualidade

O último estudo europeu de que dispomos aponta para 30 minutos o tempo médio que os pais passam por dia numa relação exclusiva com os filhos. Vários outros estudos revelam-nos que nos últimos quinze anos as crianças se tornaram mais nervosas e irritáveis, mais rabugentas e caprichosas, mais deprimidas e solitárias, mais impulsivas e desobedientes. Estas mudanças são uma consequência das mudanças na sociedade.
Os dias passam-se numa sucessão de coisas para fazer, com ambos os pais a trabalhar e pouco apoio da família alargada, sendo as crianças envolvidas no nosso stress; neste quadro os filhos, em vez de cooperarem, parecem «inventar» motivos para as zangas, acabando por fazer perder a paciência com tantas birras. Se pararmos para pensar, facilmente conseguimos perceber que estas alterações trazem repercussões na vida dos mais pequenos.
Culpabilizarmo-nos não adianta, até porque é difícil mudar o ritmo de vida. O que podemos é, em conjunto, pensar em minimizar estes efeitos negativos.
É frequente que a criança que tem um comportamento adequado na creche ou no Jardim-de-Infância, chegue a casa e se transforme numa autêntica pestinha. É em casa que ela se sente mais à vontade e pode descarregar um pouco as tensões de todo o dia, com as pessoas com que tem uma relação afectivamente segura: os pais. Também nós, à noite em casa temos atitudes e mesmo formas de estar que não temos noutros lugares (poder gritar ou andar de chinelos, por exemplo...). Talvez assim seja mais fácil entender o porquê de tantas birras: se a criança se está a portar muito bem nós aproveitamos para fazer mais umas coisas, deixando-a sossegada. Pelo contrário, se a criança se começa a portar mal, se vai mexer no que é perigoso ou se não faz o que lhe pedimos, nós temos de intervir e frequentemente acabamos ralhando, castigando ou dando uma palmada; a criança vai interiorizando um modelo de relação errado: se eu me portar bem ninguém me liga nenhuma, mas pelo contrário se eu me portar mal têm obrigatoriamente que me dar atenção.
Estarmos conscientes desta situação é dar o primeiro passo para poder ultrapassá-la. Ficarmos com sentimentos de culpa não resolve o problema, até porque é fácil encontrar desculpas: Ainda é pequenino… Isto é sono…Tem uma personalidade muito forte… E acabamos por ceder… a criança leva a sua avante… Só que à medida que ela cresce começa a ser cada vez mais difícil controlar o seu mau génio… até que os pais percebem que é «de mais» e que já é difícil mudar; a criança habituou-se a controlar a relação, os pais já não se conseguem impor…
Os comportamentos são uma poderosa forma de comunicação. Cabe-nos a nós entendê-los para saber como agir. De nada adianta desculpabilizar o comportamento da criança - mesmo que compreendamos a sua razão – mas sim ter um papel importante na sua estruturação psíquica. O balanço entre independência e autonomia é a base da estabilidade emocional. Os pais deverão encontrar um equilíbrio entre a ausência de regras (permissividade) e um controlo intrusivo.
Foi feita a seguinte experiência com um grupo de crianças de quatro anos, em que a cada uma era dito: «Vou deixar-te sozinho nesta sala e naquela caixa está um bombom. Se o fores buscar, só ficas com esse, mas se esperares que eu volte, dar-te-ei dois em vez de um”. Cerca de dois terços das crianças esperaram enquanto um terço não o fez e só obteve um bombom. Doze a catorze anos mais tarde, as mesmas crianças foram avaliadas. Aquelas que conseguiram resistir tinham mais confiança nelas próprias, eram mais eficazes a ultrapassar obstáculos, mais persistentes e menos vulneráveis ao stress e ao fracasso. Em contrapartida, as que tinham comido o bombom, eram mais indecisas, com dificuldade em resolver problemas quando encontravam obstáculos, mostrando tendência para abandonar a tarefa ao primeiro fracasso.   
A aptidão para gerir a frustração e para adiar uma satisfação é um elemento fundamental da capacidade de sermos felizes. Só aprendendo a gerir a frustração é que se torna possível realizarmos os nossos projectos e desenvolvermos relações harmoniosas com os outros.

Como agir?

Permitimos que as nossas crianças se tornassem consumistas e estas aprenderam a fazer birras quando não obtêm aquilo que querem. Distrair as crianças com outro objecto pode resolver a birra, mas perde-se uma oportunidade para ajudá-las a gerir a sua frustração. Devemos entender o seu desejo, deixá-la verbalizar a fúria que sente, dizer-lhe que a compreendemos, que seria bom ter aquele brinquedo, só que agora não o vamos comprar… sabemos que está um bocadinho triste, até podemos perder algum tempo a ver com ela os brinquedos, dizer-lhe quais é que nós gostamos mais e deixá-la contar-nos quais é que mais gosta. Assim, o desejo exprimido de ter o brinquedo desaparece perante a satisfação de uma outra necessidade: de se sentir em relação com o mundo, de partilhar.
Podemos, se for um objecto que a criança quer muito, adiar a satisfação da necessidade para uma altura especial (aniversário/Natal), sendo recebido com muito mais prazer. Adiar a satisfação da necessidade é uma óptima forma de ajudar a gerir a frustração, contribuindo para a criação de crianças emocionalmente mais estáveis e por isso mais capazes de enfrentar os «nãos» que lhes vão surgir ao longo da vida.
Estabelecer limites é dos passos mais importantes para diminuir a frequência dos comportamentos inadequados. Muitas vezes os pais não são consistentes - num dia permitem aquilo que recusaram no dia anterior – e não antecipam à criança as consequências da sua acção. Se a criança agride (outra criança ou mesmo o adulto), devemos explicar-lhe que percebemos que está zangada mas não vamos permitir-lhe que bata. É importante que a criança compreenda que pode ter sentimentos negativos, mas não pode ter comportamentos desadequados. Os pais devem estabelecer limites aos actos, não aos sentimentos. Os adultos devem ajudar a criança a pensar estratégias para que, da próxima vez que vivenciar uma situação semelhante, possa agir correctamente.

Saber estabelecer limites
Os adultos, ao estabelecer limites para os comportamentos inadequados das crianças, devem transmitir com clareza as consequências do cumprimento e do incumprimento das regras.
– Consequências para o bom comportamento: atenção positiva, elogio, privilégio, recompensa.
– Consequências para o mau comportamento: negação da atenção, perda de privilégios e ausência de recompensas. As consequências devem ser consistentes, justas e relacionadas com o comportamento em causa.

Que soluções?
Uma delas está na mudança de atitude: procure encontrar diariamente alguns momentos de qualidade com a criança – nem que sejam alguns minutos, desde que ela os sinta como momentos de prazer são esses que vão contar. São os momentos de partilha que constroem as relações positivas.

E falar sempre nas emoções. Traduza por palavras as suas emoções – positivas e negativas para que a criança as vá interiorizando. Verbalize sempre o quanto gosta do seu filho, mesmo quando está zangado. Dê-lhe mimo porque é enquanto pequeno que ele precisa de beijinhos e abraços e nunca foi isso que estragou uma criança. Seja consistente e cumpra sempre o que prometeu: as crianças são justas e precisam de autoridade e de limites para crescerem seguras.

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Terça-feira, 21.12.10

Sexualidade infantil

Por Filomena Santos Silva, Psicóloga

Um assunto premente numa sociedade em que, cada vez mais cedo, as crianças são confrontadas com alusões mais ou menos directas ao tema, nomeadamente na televisão (anúncios e telenovelas)

Rodeada de tanta informação, aliada ao normal desenvolvimento, surge a curiosidade da criança em relação à sexualidade. Alguns pais disfarçam e mudam de assunto, sem saber como responder às dúvidas. Outros estimulam, achando que tudo é natural ou respondendo de forma demasiado científica às questões das crianças.
Desde há muito que sabemos que a sexualidade infantil é uma construção psíquica, que se inicia no nascimento e evolui até ao final da adolescência, levando, na maioria dos casos, à escolha de um objecto heterossexual na idade adulta. Uma sexualidade bem construída é fundamental para o desenvolvimento da personalidade e da capacidade de estabelecer relações afectivas estáveis.
Como evolui a sexualidade infantil? Desde que o bebé nasce que tem sensações, emoções e sentimentos ligados ao sexo biológico, isto é, tem sexualidade. Assim, o bebé irá evitar a dor e procurar o prazer. Freud chamou, a esta fase, Fase Oral, em que o bebé aprende a esperar pela satisfação dos seus desejos e onde procura explorar e conhecer o seu corpo (observa as mãos e os pés, leva-os à boca, experimenta os timbres da sua voz, toca nos órgãos genitais).
Por volta dos dois anos a criança começa a controlar os esfíncteres, ou seja, compreende que é ela que deve reter o chichi e o cocó. Esta fase, a que Freud chamou Fase Anal, é muito importante para a sua sexualidade, pois, para além de ser uma fonte de prazer, permite à criança compreender que é ela que controla o seu corpo.
Aos três anos, ela apercebe-se da diferença anatómica entre sexos, o que traz repercussões psicológicas importante ao nível da organização da sexualidade infantil (marcada por uma curiosidade natural pelo seu corpo e pelo do outro) e da posterior construção de uma identidade individual e sexual adequada.
Aos 4 e 5 anos a criança começa a aceitar-se a si mesma numa dimensão psico-sexual, enquanto rapaz ou rapariga e a experimentar comportamentos e sentimentos associados a essa definição, havendo uma identificação com o progenitor do sexo oposto, que já tinha sido iniciada aos três anos. Freud designou este período por Fase Fálica, onde se consolida grande parte da identidade sexual.
Os pais e educadores devem encarar como natural a sexualidade da criança e esclarecer, de maneira clara e simples, a curiosidade sexual da criança na medida em que ela surge. Uma óptima estratégia é devolver a questão à criança, perguntando-lhe: “O que é que tu achas sobre isso?” Dessa forma, é possível adaptar a resposta ao grau de conhecimento e de desenvolvimento da criança; é importante adequarmos a informação: esta deve ser exacta, sem tabus e receios de utilizar as expressões correctas.
Se a atitude do adulto for de constrangimento, respondendo com evasivas, estará a passar à criança uma mensagem de que a sexualidade é negativa ou proibida. Se o adulto optar por fugir do tema, ela irá procurar satisfazer a sua curiosidade noutro lado. Se não souber exactamente como explicar, digam à criança que irão procurar um livro, adequado à sua idade, que ajude a entender o assunto.

Necessidades e curiosidade

Ocorrem com alguma frequência a exploração e a manipulação dos órgãos genitais, a exibição ou o toque no corpo de outra criança. As crianças também têm necessidades sexuais, curiosidade e prazer na estimulação do seu próprio corpo. A atitude dos adultos perante este facto é muitas vezes de embaraço e de recriminação, provocando um sentimento de culpabilidade e a ideia de que a sexualidade é negativa. Nestes casos deve conversar calmamente com a criança e explicar-lhe que não faz mal ela mexer no corpo, mas que só o deve fazer quando estiver sozinha. Diga-lhe que percebe que ela esteja interessada em conhecer o seu corpo e o das outras pessoas e mostre-se disponível para conversar, para que ela não sinta necessidade de satisfazer a sua curiosidade natural com o grupo de pares.

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Terça-feira, 14.12.10

“Pensamento social” e a infância

Por Rita Alambre dos Santos, especialista em Educação Especial e Reabilitação e directora-geral da Fundação Renascer. Estágio de observação no “Social Thinking

A maior parte da aprendizagem social é feita por observação. Quer isto dizer que as crianças têm o talento natural para reparar na forma como os outros à sua volta estão a fazer e adaptar o seu próprio comportamento àquilo que é esperado em determinado contexto.

O Pensamento Social ou Inteligência Social consiste na capacidade que temos para reconhecer e compreender os pensamentos, emoções, desejos e intenções das outras pessoas, encontrando-lhes sentido e sendo capaz de predizer o que farão a seguir. De uma forma mais simples, podemos dizer que é a capacidade de nos colocarmos no lugar do outro. Desta competência depende a nossa capacidade de adaptação aos diferentes contextos e o sucesso ou não das nossas relações interpessoais, sejam elas íntimas ou casuais, familiares ou de trabalho... Permite-nos compreender a situação global e “intuir” a atitude a tomar perante determinado cenário. As competências sociais são os instrumentos que temos à nossa disposição para cumprir o objectivo final, ou seja, que comportamento tomar de maneira a que os outros pensem de mim aquilo que eu quero que pensem.
A capacidade para o desenvolvimento do pensamento social é inata, na maior parte de nós, sendo a sua aprendizagem feita por observação e imitação, ao longo de toda a vida. Na realidade trata-se de uma aprendizagem intuitiva, da qual temos pouca consciência. Por outro lado está também dependente da observação e compreensão de uma série de componentes da linguagem não-verbal, como as expressões faciais, o tónus corporal, a proximidade/distância a que nos colocamos dos outros, o tom de voz, etc., mais do que das palavras que são ditas.
De acordo com isso, desde o nascimento o bebé encontra-se num diálogo permanente com os seus pais, sendo capaz de alterar os seus comportamentos de forma a suprir as suas necessidades imediatas, bem como de ler os comportamentos destes, atribuindo-lhes significado.

O “treino das regras”
Se estivermos perante uma criança que não apresenta um défice na cognição social, a família, a escola, bem como outras actividades em que a criança esteja envolvida, incumbir-se-ão de fazer o seu papel de forma natural, ou seja, recompensá-la pelos comportamentos adequados e punir aqueles que não o são.
Pais e professores podem estimular estas competências, ajudando a criança, a partir dos quatro anos de idade, a compreender as consequências das suas acções nos pensamentos e sentimentos das outras pessoas em relação a ela e a reconhecer que tem poder para modificar a percepção dos outros a seu respeito.
Nas crianças mais novas, costuma ser útil a concretização destes conceitos em ferramentas mais fáceis de utilizar.
Michelle Garcia Winner (terapeuta da fala americana, especialista nesta temática e em crianças com défice de atenção) fala-nos de “pensamentos azuis versus pensamentos encarnados”, de “ficheiros de amizade” ou do “detective social” que há em cada um de nós. O que é que isto significa numa situação concreta? Quando estamos perante uma situação nova, em que não sabemos comportarmo-nos como é suposto, usamos os nossos olhos para pensar nos outros e para encontrar pistas no contexto que nos cerca. Agimos como um detective à procura de pistas para resolver um problema.
O objectivo é que os nossos comportamentos despertem nos outros “pensamentos azuis”, ou seja, pensamentos agradáveis que fazem com que gostem de nos ter por perto. Todos esses pensamentos irão ser guardados no “ficheiro” que têm na sua cabeça com o meu nome escrito. Da próxima vez que me virem, esse ficheiro abrir-se-á automaticamente e a reacção das outras pessoas à minha presença será tão mais positiva quanto maior o número de pensamentos azuis que tiverem armazenado a meu respeito.
Esta concretização de conceitos é o contrário do que geralmente fazemos com as crianças pequenas e ajuda-as a organizar o pensamento e serem capazes de cumprir aquilo que lhes é pedido. Na maior parte das vezes limitamo-nos a utilizar uma linguagem abstracta como, por exemplo, “porta-te bem”. Ora, esta frase por si só é completamente vazia de significado se não explicarmos à criança o que, concretamente, consideramos ser “portar bem”. É preciso ser preciso e objectivo naquilo que se quer, caso contrário é muito provável que adultos e crianças acabem frustrados no processo de gestão dos comportamentos.
Uma vez apreendidas essas regras, como mantê-las e desenvolvê-las? Existe um mecanismo básico por detrás do pensamento social que uma vez apreendido fará com que a pessoa seja capaz de resolver situações diferentes utilizando a generalização do que aprendeu. No entanto, esta generalização não ocorre nas pessoas em que existe um défice da cognição social, sendo desejável que possa contar com o apoio de um técnico para a ajudar a decifrar os códigos sociais a que ainda não teve acesso.
Com as diferentes fases da vida, surgem novos desafios, sendo que as dificuldades para encontrar uma solução eficaz e de forma autónoma persistem, podendo dar origem a comportamentos bizarros. Por exemplo, durante a infantil ou mesmo na escola primária, é visto como natural saltar para o colo da mãe quando ela vai buscar o filho à escola e enchê-lo de beijos. No entanto, o mesmo comportamento na entrada para o 2º ciclo será visto como desadequado pelos colegas. O mesmo se pode passar em relação à proximidade física com a professora.
A chegada da adolescência e do interesse pelo sexo oposto pode também levantar problemas, na medida em que os pensamentos mais íntimos em relação ao outro, podem ser considerados grosseiros ou mesmo ofensivos quando verbalizados sem qualquer censura.

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Terça-feira, 07.12.10

Ter medo na infância

 Texto: Filomena Santos Silva, Psicóloga

É uma situação absolutamente normal em qualquer criança de idade pré-escolar. O que fazer para o enfrentar?

Existem medos reais que são importantes para a sobrevivência da criança (medo das alturas, medo de animais selvagens, de ladrões, etc.), e que devem ser encarados com naturalidade pois são medos protectores e que levam ao evitamento dos estímulos que os desencadeiam.

Mas a grande maioria dos medos infantis relaciona-se com situações que a criança não controla e que causam insegurança, tal como o medo do escuro, dos pesadelos, de ser abandonada, de ir ao dentista, pequenos animais, etc.

Um dos mais frequentes é o medo do escuro: a criança até aos 6 anos de idade tem um jogo simbólico intenso, onde a fronteira entre a realidade e a fantasia nem sempre é clara… neste contexto, os monstros surgidos nos sonhos, os barulhos no escuro ou as sombras do quarto transformam-se facilmente em ameaças terríveis e angustiantes.

Brinque com ela ao “quarto escuro” e faça “explorações nocturnas” por toda a casa com a ajuda de uma lanterna, mostrando como a casa é segura e ajudando assim a criança a enfrentar os seus medos. É desejável tornar as situações previsíveis, para que a criança possa controlar a ansiedade despoletada por situações novas: se ela vai a uma consulta médica ou ao dentista explique-lhe o que vai acontecer, contando sempre a verdade; não omita a existência de dor, antes explique-lhe que vai passar depressa e reforce o bom comportamento com algo positivo para a criança (por exemplo: “Vais ser um crescido na vacina e a seguir vamos lanchar ao café”).

Com o crescimento os medos vão diminuindo de intensidade, à medida que a criança adquire um maior autocontrolo. O papel dos pais e educadores é ajudar a criança a ultrapassá-los, promovendo a confrontação progressiva com os objectos fóbicos (ou seja, causadores do medo).

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