Flúor: amigo ou inimigo?

 

 

 

Por Helga Leite, especialista em Odontopediatria e Ortodontia (Clínica São Pedro da Malveira)

Este é o assunto que mais dúvidas suscita aos adultos que acompanham as crianças à consulta...

A quantidade de informação antagónica e pouco esclarecedora que veiculam nos media, associada a textos desactualizados divulgados em alguns blogues e edições antigas de livros que não foram revistas, merecem a confusão dos pais mais atentos.
A cárie dentária é uma doença infecciosa e transmissível caracterizada pela perda de estrutura mineral do dente (desmineralização). No seu estádio inicial apresenta-se como uma mancha branca e numa fase mais avançada apresenta-se cavitada, podendo ou não ser dolorosa. É a combinação de quadro factores que desencadeiam a cárie:
– Criança e dentes susceptíveis.
– Microrganismos presentes no biofilme dentário (a maior parte das cáries são produzidas por bactérias pertencentes ao grupo Streptococcus mutans; a colonização da boca do bebé por estas bactérias ocorre com a erupção dos dentes de leite e quanto mais precoce for essa colonização, maior será a probabilidade dessa criança desenvolver cáries. A principal fonte de transmissão de S. mutans é o adulto que passa mais tempo com o bebé e o veículo de transmissão é a saliva do adulto).
– Dieta cariogénica (a maior frequência de ingestão de açúcares está associada a maior probabilidade de desenvolver cáries).
– Tempo (o desenvolvimento da cárie é um processo lento, necessitando por isso que os três factores acima indicados se combinem pelo tempo necessário).
Resumidamente, poderemos afirmar que os factores microrganismos, dieta e tempo poderão ser controlados com mudanças de comportamento e cuidados de higiene oral adequados (escovagem pelo menos duas vezes por dia). É no factor hospedeiro (criança/dente) que reside a acção do flúor.

O papel da saliva
O dente é constituído por quatro estruturas de composição distinta: esmalte e dentina (coroa), cemento (raiz) e polpa (nervo) que se encontra no interior do dente.
A constituição do esmalte é maioritariamente inorgânica e os seus minerais em geral, encontram-se em equilíbrio com a saliva. As trocas entre o esmalte e a saliva são constantes e dependentes do valor de pH da saliva (determinado pelo grau de acidez da saliva).
Na presença de açúcar, as bactérias do biofilme aderente à coroa, produzem ácidos. A presença destes ácidos intensifica a desmineralização, ou seja perda de minerais para o meio bucal. Se esta situação se perpetuar por um período de tempo prolongado (consumo ininterrupto de alimentos açucarados), esta desmineralização poderá desencadear cárie. Caso a situação não perdure, a saliva volta a repor os minerais perdidos no esmalte dentário (remineralização).

Como actua o flúor
O flúor tem a capacidade de aumentar a resistência do dente ao processo de desmineralização, ou seja, não evita as cáries, simplesmente diminui a velocidade com que elas se formam. Além disso, é fundamental que a concentração de flúor na cavidade oral se mantenha constante, pelo recurso a pastas dentífricas fluoretadas, bochechos com flúor e aplicações tópicas no consultório. O recurso a gotas e comprimidos não é recomendado por dois motivos:
– A protecção que o flúor fornece ao dente só existe enquanto este está presente na cavidade oral.
– O risco de fluorose dentária (manchas inestéticas que podem variar do branco ao castanho em graus mais severos, resultantes da ingestão de excesso de flúor no período de formação dos dentes).
Como usar? O flúor deve ser indicado conforme a necessidade de cada criança e diferentes combinações podem ser aconselhadas pelo odontopediatra dependendo da idade da criança e do risco ou actividade de cárie. Em termos gerais podemos resumir as prescrições do seguinte modo:
– Crianças até aos dois anos: não usar pasta dentífrica; se têm cáries, o recurso ao flúor só pode ser decidido pelo odontopediatra
– Crianças 3-5 anos:
Sem cáries: pasta dentífrica com 250 a 500 ppm de flúor.
Com cáries: além da pasta dentífrica pode ser recomendada a aplicação tópica de flúor em gel ou verniz pelo odontopediatra
– Crianças com mais de cinco anos:
Sem cáries: pasta dentífrica com até 1100 ppm de flúor.
Com cáries: pasta dentífrica com 1100 ppm de flúor e bochechos de flúor; em alguns casos é aconselhável a aplicação tópica de flúor pelo odontopediatra; se a criança apresenta uma actividade de cárie bastante evidente, é aconselhável fazer parte de um programa intensivo de flúor em consultas periódicas no consultório.

Alguns cuidados para evitar a ingestão de flúor

– Não deixar as pastas de adulto ao alcance da criança.
– Ensinar a criança a cuspir a pasta.
– Aprender a escolher a pasta (ver “F” escrito na embalagem).
– Para crianças dos 3-5 anos usar uma quantidade de pasta equivalente ao limpar a tampa com as cerdas.
– Para crianças com mais de cinco anos usar uma quantidade de pasta equivalente a uma ervilha.
– Não escovar os dentes de estômago vazio, pois se a criança engolir, aumenta a absorção.

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publicado por salinhadossonhos às 07:33 link do post | comentar | favorito